terça-feira, 4 de novembro de 2008

O Inverno que nos alcança


Depois do aviso começamos a sentir que aquele vento de fogo, seco, ácido, duro, soprado feito açoite, trançado na poeira, vai esmorecendo, trocado por outro mais ameno, húmido, com mais pétalas de água.
Vai chegando devagar, mudando as cores dos jardins, como se tivesse vindo de muito longe, das lonjuras de onde só os ventos e as dores podem vir. Nas ruas do centro as mulheres já exibem casacos que cheiravam a guardado de tanto esperar.
As lojas de roupa anunciam as liquidações. A noite vai esfriando, pedindo coberta e paz entre os casais, porque todos sabem que não se devem zangar nos tempos de frio.
Há o espectáculo de olhar pela janela, manhã cedo, e ainda ver a neblina que levanta devagar, com preguiça de acordar e tristeza de separar-se da cidade, cortada em fatias pelos que correm nas avenidas e madrugadores do trabalho, e pelo alto dos edifícios, fazendo recortes no horizonte, como se fossem as montanhas que não temos. E os corações abalados pelas aventuras do Verão vão-se entregando feito quixotes que desistiram dos moinhos de vento, e buscando o aconchego dos amores de Inverno, mais delicados e permanentes.
Nas casas, os chás e o chocolate quente voltam à mesa, o café na livraria é um prazer quase irresistível.
E, uma vez por outra, tenho surpreendido a lua, exposta e nua, em plena tarde, perdida de amor pela vida nos antigos becos.
O Inverno já galanteia a elegância das mulheres. Eu sei e sinto que ele é apenas o meu tempo.

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