quarta-feira, 2 de julho de 2008

Barco Ancorado 02/07/2008


Rita Lee esteve no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, ontem à noite. Uma sala quase lotada assistiu ao regresso da cantora brasileira, integrado na sua "Picnic Tour". Ou seja um espectáculo recheado de êxitos para celebrar 40 anos de carreira da "vovó" do rock brasileiro. Foi com 'Flagra (No Escurinho do Cinema)', um dos seus temas mais conhecidos, que Rita Lee presenteou desde logo os presentes na sala lisboeta. Mas o escurinho aconteceu apenas na letra da dita canção, porque o espectáculo visual, esse, fez-se de cor, muita cor. As luzes e figuras psicadélicas que iam aparecendo no ecrã encontravam rival à altura no visual da cantora, que se apresentou com a sua imagem irreverente de sempre, desta feita em forma de chapéu verde, óculos de lentes avermelhadas, calças e colete pretos e camisa de padrão e colorido tropicais. Hoje, Rita Lee passa pelo Barco Ancorado.

Rita Lee é também uma actriz em palco e encarna várias personagens nos seus temas, usando acessórios e piadas a gosto, ao seu jeito viperino, para os introduzir. Em Lisboa, nem Scolari escapou. Ou então a versão para 'I Want to Hold Your Hand', dos Beatles, servida numa adaptação lírica para português e arranjos musicais de forró, com direito a chapéu nordestino e ferrinhos e referências desdenhosas a Yoko Ono, apenas denominada de «a japonesa».
A diversidade interpretativa de Rita Lee em palco foi sendo acompanhada pela alternância dos temas mais rock com as baladas mais pop e os passos de dança do público. O desfiar das memórias do baú musical da cantora que fez parte dos Mutantes, encontrou um coro afinado em uníssono. Nem de propósito, 'Mutante' foi uma delas, sendo que noutras a artista simplesmente parou para ouvir o reflexo sonoro das suas canções nas vozes dos seus fãs. 'Doce Vampiro' ou 'Ovelha Negra' deram o exemplo. Nesta última houve também lugar a projecções autobiográficas com fotografias suas.

Se a familiaridade com a cultura nacional é notória em Rita Lee, há coisas mais modernas que a surpreenderam num dos passeios recentes pela capital portuguesa. Ao pedir opinião à lojista de um estabelecimento comercial onde experimentou umas calças, obteve a seguinte resposta: «estão um bocado apertadinhas no cu», contou, completando sem esconder a indignação, «eu sou uma senhora, pô». E esta senhora deu mais meia dúzia de canções no Coliseu, deixando o melhor para o fim e oferecendo no encore uma sequência que juntou clássicos como 'Mania de Você', 'Banho de Espuma', 'Desculpe o Auê', 'Erva Venenosa' ou 'Lança Perfume'.

Rita Lee é também uma senhora de família e esta esteve em palco: o companheiro de longa data Roberto Carvalho e o filho Berto Lee, ambos nas guitarras. Daí que o gesto de lamber o braço a um dos guitarristas (no caso, o filho) tenha aqui o condão de dar um toque de maturidade à atitude de irreverência roqueira. De resto, em Rita Lee tudo parece encaixar naturalmente. Ela até pode ser uma "avó do rock" mas é-o com estilo, garra e sentido de limites. Conforme a própria ao parafrasear Nelson Rodrigues, é caso para dizer: «jovens, envelheçam».

Alinhamento
Rita Lee – Amor e sexo
Rita Lee – Caso sério
Elis Regina – Me deixas louca
Adriana Calcanhoto - Devolva-me
Chico Buarque – Lança perfume
Rita Lee – Lança perfume
Arnaldo Antunes – O silêncio
Caetano Veloso – Beleza pura
Rita Lee – Desculpe o auê

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