quinta-feira, 23 de abril de 2009

Barco Ancorado 23/04/2009


«Zii e Zie» é o nome do novo álbum de Caetano Veloso. Em Abril, quando o Outono carioca já sopra na Avenida Atlântica, e a Europa recebe as últimas chuvas frias, Caetano apresenta mais uma incongruência genial. Nada de novo. Apenas o sublime.
É. Caetano Veloso tem dificuldades em enganar-se. Melhor. Tem dificuldade em acertar. Tem extrema urgência no erro. Cumpre-o até ficar perfeito. Agarrando nas palavras de um tijucano célebre, Tim Maia, Caetano Veloso é uma espécie de «tudo é tudo e nada é nada». A filosofia Maia, tão descabida quanto eficaz, é apenas uma pequena parcela da vida de Caetano Veloso.
O Barco Ancorado desta quinta-feira apresenta-lhe o novo trabalho de Caetano.

«Zii e Zie» comprova que o baiano de Santo Amaro não se define pela negação. Ou seja, ele “não é isto nem aquilo”. Ele é tudo. O sucessor de «Cê» é tão somente a exploração contínua do tropicalismo. O uso da memória dos Mutantes à luz de uns menininhos cariocas, amigos do seu filho Moreno Veloso. O movimento tropicalista, ou «uma revisão do ie-ie», como sarcasticamente apelidou o escritor Ruy Castro, nunca terminou. Nunca lhes apeteceu. Nem mesmo quando Gilberto Gil se fez à gravata em Brasília. Aquilo era tão somente um preto de rastas aprumado com uma gravata. Aquele preto que o Caetano tanto gosta.

O baianinho explora-se, só mais uma vez, neste novo álbum. Ele, um melómano doentio, deixa-se levar pelo empirismo louco. Agarra nas guitarras rock de «Cê» e apura uma banda que dança melhor à segunda tentativa de disco em conjunto. Caetano substitui o violão tão próspero da última década e entrega-o à irreverência de uma turminha comandada pela sensibilidade de Pedro Sá e Moreno Veloso.

O novo álbum de Caetano Veloso acrescenta lirismo conceptual. Ou quase, que as coisas com Caetano não se querem definitivas. Além das tricas com Lobão («Lobão tem razão»), política distraída («A Base de Guantanamo»), e um piscar de olho a Aveiro («Menina da Ria»), «Zii e Zie» tem o Rio de Janeiro na frente da fotografia. Ele, o Rio, está lá todo. Do Leblon à Lapa. Do cosmopolita ao mestiço. Do Fassano de Ipanema ao Morro da Dona Marta. Entrem todos na festa, que Caetano banca de bom agrado. Banca e festeja. Engana e sorri. Canta e toca em Deus. O Tio Caetano (e as suas tias - «Ziie e Zie», expressão retirada de uma tradução de um livro de Orhan Pamuk) quer consistência frágil para uma nova etapa.

Alinhamento
Caetano Veloso – Base de Guantánamo
Caetano Veloso – Sem cais
Gal Costa – Força estranha
Gilberto Gil – Super homem – a canção
Chico Buarque – Fado tropical
Caetano Veloso – Falso Leblon
Maria Bethânia – É o amor
Milton Nascimento - Vida
Ney Matogrosso – Jeito de amar
Caetano Veloso – Menina da Ria

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