quarta-feira, 28 de julho de 2010

Barco Ancorado 28/07/2010


Depois de experiências recentes em locais ingratos para o tipo de intimismo da sua música (como o pátio do CCB ou o Pavilhão Atlântico), Caetano Veloso voltou a uma das salas que melhor o trata e que tão bem conhece: o místico Coliseu dos Recreios (que o recebeu há pouco mais de dois anos).
Coincidindo com o espírito do seu último álbum Zii e Zie, Caetano Veloso e a sua Banda Cê (com Marcelo Callado na bateria, Pedro Sá na guitarra eléctrica e Ricardo Dias Gomes no baixo e nos teclados) basearam o seu espectáculo num formato de rock mais experimental: rockeiro fisica e instrumentalmente; mas sambista na alma, nos coros e no ritmo - ou uma nova actualização dos códigos do tropicalismo.

Houve dois momentos particularmente tocantes entre as novas músicas do alinhamento. A interpretação abnegada de Perdeu (a música de abertura de Zii e Zie) faz com que Caetano e grupo liguem o pós-punk à Wire ao pagode e alarguem o horizonte da música. E o rock de intervenção anti-Casa Branca de Base de Guantánamo inspira uma iluminação avermelhada e guerrilheira e uma exploração da fantástica voz de Caetano Veloso nos extremos de uma montanha russa de agudos e graves, numa inclinação de tonalidades que aumentava à medida que a performance ia acalorando.

O noise e as diabruras das guitarras eléctricas de Caetano Veloso e, sobretudo, de Pedro Sá dão a sensação que andam a ouvir Sonic Youth e afins, mas a um modo muito brasileiro... Claro que esta rede sonora mais garageira ia também expandindo-se noutros temas de outros tempos, sobretudo Eu Sou Neguinha?, que ganha uma plataforma eléctrica mais hendrixiana. O problema é que nem todas as franjas do público presente que enchia o Coliseu compreendiam muito bem o que se estava ali a passar.

Talvez quisessem um momento acústico mais MPB como aconteceu na interpretação solitária de Caetano, à viola, de Desde que o Samba É Samba; e aí a sala despertou, e houve até quem se levantasse. Mas foi no momento final do único encore que se conseguiu a unanimidade total, a sala iluminada, muita dança na plateia e um Caetano Veloso ainda mais sorridente: o milagre dá pelo nome de A Luz de Tieta (sempre festiva) e foi a última canção do concerto de quase duas horas.

Alinhamento
Caetano Veloso - Trupicália
Caetano Veloso – Base de Guantánamo
Gal Costa – A preta do Carajé
Gilberto Gil – Buda Nagô
Chico Buarque – Acorda amor
Caetano Veloso – Trilhos urbanos
Maria Bethânia – Não dá mais pra segurar
Ney Matogrosso - Fascinação
Arnaldo Antunes – O silêncio
Caetano Veloso – Falso Leblon

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